terça-feira, 20 de setembro de 2016

Revolução Francesa: observações históricas e historiográficas. Igor de Lima

                  “Se a economia do mundo do século XIX foi formada principalmente sob a influência da revolução industrial britânica, sua política e ideologia foram formadas principalmente pela Revolução Francesa. A Grã-Bretanha forneceu o modelo para ferrovias e fábricas, o explosivo econômico que rompeu com as estruturas socioeconômicas tradicionais do mundo não europeu; mas foi a França que fez suas revoluções e a elas deu suas aldeias, o ponto de bandeiras tricolores de um tipo ou de outro terem-se tornado o emblema de praticamente todas as nações emergentes, e a política européia (ou mesmo mundial) entre 1789 e 1917 foi em grande parte a luta a favor e contra os princípios de 1789, ou os mais incendiários de 1793. A França forneceu o vocabulário e os temas da política liberal e radical democracia para a maior parte do mundo. A França deu o primeiro grande exemplo, o conceito e o vocabulário do nacionalismo. A França forneceu os códigos legais, o modelo de organização técnica e científica e o sistema métrico de medidas para a maioria dos países. A ideologia do mundo moderno atingiu as antigas civilizações que tinham até então resistido as ideias europeias inicialmente através da influencia francesa. Esta foi a obra da Revolução Francesa”. (Hobsbawn. pp. 83, 84)
                   Abordando da crise do final do Setecentos, Hobsbawn afirma que esta  atingiu “os velhos regimes da Europa e seus sistemas econômicos e suas últimas décadas foram cheias de agitações políticas, às vezes chegando o ponto de revolta, e de movimentos coloniais em busca de autonomia, às vezes atingindo o ponto de secessão; não só nos EUA (1776-83) mas também na Irlanda (1782-84), na Bélgica e em Liège (1787-90), na Holanda (1783-7), em Genebra e até mesmo – conforme já se discutiu – na Inglaterra (1779). A quantidade de agitações políticas é tão grande que alguns historiadores mais recentes falaram de uma era de ‘revolução democrática’, em que a Revolução Francesa foi apenas um exemplo, embora mais dramático e de maior alcance e repercussão”. (Idem, p. 84)
                    Para Hobsbawn a Revolução Francesa foi “fundamental”, obtendo “consequências mais profundas”. (Idem, p. 85) Seus ideais atingiam o socialismo e comunismo modernos. (Idem, p. 85) Conforme o mesmo, “é a revolução de seu tempo, e não apenas uma, embora a mais proeminente, do seu tipo. E suas origens devem portanto ser procuradas não meramente em condições gerais da Europa, mas sim na situação específica da França. Sua peculariedade é talvez melhor ilustrada em termos internacionais. Durante todo o século XVIII, a França foi o maior rival econômico da Grã-Bretanha. Seu comércio externo, que se multiplica quatro vezes entre 1720 e 1780, causava ansiedade; seu sistema colonial foi em certas áreas (como nas Índias Ocidentais) mais dinâmicas que o Britânico. Mesmo assim a França não era uma potência como a Grã-Bretanha, cuja política externa já era substancialmente determinada pelos interesses da expansão capitalista. Ela era o mais poderoso, e sob vários aspéctos a mais típica, das velhas e aristocráticas monarquias absolutas da Europa. Em outras palavras, o conflito entre a estrutura oficial e os interesses estabelecidos do velho regime e as novas forças sociais ascendentes era mais agudo na França do que em outras partes”. (Idem, p. 86)
                    A crise do século XVIII francesa foi agravada pelos “problemas financeiros da monarquia. A estrutura fiscal e administrativa do reino era tremendamente obsoleta (...), a tentativa de remediar a situação através das reformas de 1774-76 fracassou, derrotado pela resistência dos interesses estabelecidos encabeçado pelos parlaments. Então a França envolveu-se na guerra de independência americana. A vitória contra a Inglaterra foi obtida a custo da bancarrota final, e assim a revolução americana pôde proclamar-se a causa direta da Revolução Francesa. Vários expedientes foram tentados com sucesso cada vez menor, mas sempre longe de uma reforma fundamental que, mobilizando a considerável capacidade tributável do país, pudesse enfrentar uma situação em que os gastos excediam a renda de pelo menos 20% e não haviam quaisquer possibilidades de economias efetivas. Pois embora a extravagância de Versailles tenha sido constantemente culpada pela crise, os gastos da corte só significavam 6% dos gastos totais em 1788. A guerra, a marinha e a diplomacia constituíam 1/4 , e metade era consumida pelo serviço da dívida existente. A guerra e a dívida – a guerra americana e sua dívida – partiram a espinha da monarquia”. (Idem, pp. 89-90)
                  A crise monárquica, de acordo com Hobsbawn, forneceu á aristocracia e aos parlaments a sua chance. Eles se recusavam a pagar pela crise se seus privilégios não fossem estendidos. A primeira brecha no fronte do absolutismo foi uma ‘assembléia de notáveis’, escolhidos a dedo, mas assim mesmo rebeldes, convocadas em 1787 para satisfazer as exigências governamentais. A segunda e decisiva brecha foi a desesperada decisão de convocar os Estados Gerais, a velha assembleia feudal do reino, enterrada desde 1614. Assim, a Revolução começou como uma tentativa aristocrática de recapturar o Estado. Essa foi mal calculada por duas razões: ela substimou as intenções independentes do ‘Terceiro Estado’ – a identidade fictícia destinada a representar todos os que não eram nobres nem membros do clero, mas de farto dominada pela classe média – e desprezou a profunda crise sócio-econômica no meio da qual lançava suas exigências políticas”. (Idem, p. 90)
                   O grupo social predominante revolucionário para Hobsbawn era a burguesias, sendo que “suas ideias eram o liberalismo clássico, conforme formuladas pelos ‘filósofos’ e ‘economistas’ e difundidas pela maçonaria e associações informais. Até este ponto os ‘filósofos’ podem ser, com justiça, considerados responsáveis pela Revolução. Ela teria ocorrido sem eles; mas eles provavelmente constituíram a diferença entre um simples lapso de um velho regime e sua substituição rápida e efetiva por um novo”. (Idem)
                    Não obstante, continua o historiador, no geral, a burguesia era apenas devota de um “constitucionalismo, um Estado secular com liberdades civis e garantidas para a empresa privada e um governo de contribuintes e proprietários”. (Idem, p. 91) Ainda conforme o mesmo, “oficialmente esse regime expressaria não apenas seu interesse de classe, mas também a vontade geral do ‘povo’, que era por sua vez (uma significativa identificação) ‘a nação francesa’. O rei não era Luis, pela Graça de Deus, rei de França e Navarra, mas Luis, pela graça de Deus e do direito constitucional do Estado, Rei dos Franceses. ‘A fonte de toda a soberania’, dizia a Declaração, ‘reside essencialmente na nação’. E a ‘nação’, conforme disse o Abade Sieyès, não reconhecia na terra qualquer direito acima do seu próprio e não aceitava qualquer lei ou autoridade que não a sua – nem a da humanidade como um todo, nem a de outras nações. Sem dúvida, a nação francesa, como suas subsequentes imitadoras, não concebeu inicialmente que seus interesses pudessem se chocar com os de outros povos, mas, pelo contrário, via a si mesmo como inauguradora ou participante de um movimento de liberação geral dos povos contra a tirania. (...) O povo identificado com ‘a nação’ era mais um conceito revolucionário; mais revolucionário do que o programa liberal-burguês que pretendia expressá-lo”. (Idem, pp. 91-92)
                  Enfim, contrapondo à Revolução, Hobsbawn observa que a “contra-revolução mobilizou contra si as massas de Paris, já famintas, desconfiadas e militantes. O resultado mais sensacional de sua mobilização foi a queda da bastilha, que fez do dia 14 de julho a festa nacional francesa, ratificou a queda do despotismo e foi saudada em todo o mundo como o princípio da libertação (...). O que é mais certo é que a queda da Bastilha levou a revolução para as cidades provincianas e para o campo”. (Idem, p. 94)
                   Interpretando os acontecimentos de 1789, Jean Starobinski, em 1789: os emblemas da razão, trata das transformações culturais sincrônicas a partir do ambiente deste período. Para este, “o ano de 1789 é um divisor de águas na história política da Europa. Traçaria ele uma fronteira na vida dos estilos?”, questiona-se. E pensando neste problema responde que “as revoluções não inventam imediatamente a linguagem artística que corresponde à nova ordem política. Por longo tempo ainda usam-se formas herdadas, mo momento mesmo em que se deseja proclamar a decadência do mundo antigo”. 
                   E continuando, afirma que “falar de 1789 é observar o surgimento da Revolução,  e não de seus feitos a longo prazo. É tentar compreendê-lo em seu aparecimento, na vizinhança de suas causas próximas, de seus preâmbulos, de seus sinais anunciadores. A maior parte das obras de arte que aparecem em 1789 não pode ser vista como consequência do fato revolucionário. Na França e fora da França, edifícios, quadros, óperas foram terminados no momento em que a rebelião abalava Paris e em que a monarquia francesa vacilava. Concebidas antes do acontecimento, levado por uma intenção de longo fôlego que nada mais devia à febre daqueles ardentes dias, essas obras parecem convidar-nos a interpretá-los independentemente do contexto que a história lhes deu. Semelhante coincidência não permite invocar uma derivação de causa e efeito”. (STAROBINSKI, 1998, p. 18)
                O autor, analisando a cultura artística do período revolucionário na Europa nota que “nessa aproximação entre as obras de arte e o acontecimento, a parte preponderante cabe ao acontecimento. Tão viva é a luz irradiada pela revolução que não há fenômeno contemporâneo que ela não ilumine. Quer prestem atenção nela ou a ignorem, quer a aprovem ou a condenem, os artistas de 1789 são os contemporâneos da Revolução. Nada pode fazer com que não sejam situados em relação a ela: é ela que, de certa maneira, os julga. Impõe um critério universal, que dá a medida do moderno e do antiquado. Promove, põe a prova uma nova norma do elo social, diante do qual as obras de arte não podem evitar adquirir um valor de aquiescência ou de repúdio”. (Idem, p. 19)
               Interpretando as obras de Francisco Goya (1746-1828), Starobinsky declara que em sua obra, profundamente mescladas até o angustia, a preocupação com a liberdade política, a violenta liberdade da imaginação temática, é essa liberdade de ‘toque’ que se manifesta no ato mesmo do pincel, do creiom ou da pena. A independência extrema da expressão é aqui própria de um homem que terá conhecido a maior dependência. O ano de 1789, para Goya, é o da consagração tardia de sua carreira oficial. É nomeado pintor da Câmara por Carlos IV, que acaba de chegar ao poder: executará os retratos solenes do rei e da rainha. (....)”. (Idem, p. 121) Contudo, é a partir da sua fragilidade de saúde que Goya, nos anos de 1792-93, com a surdez, que a sua sensibilidade aguça em seus quadros. (Idem, p. 125)
                Em suma, para o autor, “a França revolucionaria, foco de onde irradiava a luz dos princípios, e de que Goya esperava a expansão pacífica, faz irrupção sob a fisionomia de um exército violento, semeando a sua passagem os assassinatos e as violações absurdas. Uma inversão maléfica substitui a luz pelas trevas. A esperança foi traída, a história, que parecia progredir no sentido de liberdade, perde seu eixo positivo e se torna uma cena insensata. Como se vê, não estamos mais apenas na presença do que chamávamos, a propósito da arte neoclássica, de o retorno da sombra; vemos efetuar-se uma verdadeira permutação que substitui por uma fonte de trevas aquilo que de início parecia fonte de luz. (...)”. (Idem, p. 129)
                Michel Vovelle, em obra de síntese, em A Revolução Francesa, refaz o percurso histórico da Revolução Francesa, discutindo com autores revisionistas como François Furet, os quais fizerem uma revisão da mesma para as homenagens de duzentos anos. O autor, defende a perspectiva marxista e ainda traça avanços no debate, trazendo reflexões e explicações sobre os acontecimentos. Em primeiro lugar, declara que o Antigo Regime fora um período marcado pelo predomínio do feudalismo, da sociedade de ordens e do absolutismo. O feudalismo significaria a ruralidade da população francesa, a relação de trabalho servil, o grupo restrito de privilegiados proprietários das terras, bem como a justiça real em favor dos senhores. (VOVELLE, 2012, pp. 5-6) A sociedade organizava-se de acordo com critérios nobiliárquicos, como as patentes militares, as hierarquias psicossociais dos homens nobres, bem como os conflitos entre as ordens. (Idem, p. 8) Ademais, o absolutismo dignificava de maneira resumida a monarquia de direito divino, o catolicismo como a religião de Estado e as “cortes representavam as mais altas instâncias da justiça real, em Paris e nas Províncias. (Idem, pp. 8-9)
                Concordando com Hobsbawn, Vovelle acredita que a crise do Antigo Regime era fundamentada em causas profundas (marcadas pelas continuidades) e imediatas (marcadas pelos últimos acontecimentos e pela conjuntura. O autor destaca, como o inglês, a crise econômica e a alta nos impostos, como o imposto sobre o sal, a incapacidade reformista dos ministros de Luís XV e de Luís XVI, a contestação aos privilégios da aristocracia nobiliárquica, tanto da nobreza cortesã quanto da provinciana. (Idem, p. 10)
               Durante os anos de 1787 e 1789, mesmo a nobreza entrava em confronto com o rei, a favor dos “privilegiados” e contraditoriamente impossibilitando a salvação do “sistema monárquico”. (Idem, pp. 12-13) E, Vovelle insere seu trabalho a questão: “Revolução Francesa, revolução da miséria ou revolução da propriedade. (Idem)
                Para responder essas questões começa a narrar os problemas centrais como a crise de fome, carestia de alimentos, alta dos preços, fatos estes que faziam as camadas populares se associaram “a uma reivindicação burguesa que se insere indiscutivelmente na continuidade da prosperidade secular”. (Idem, pp. 13-14) No quadro da participação dos grupos sociais, o autor também destaca o papel da rica, mas diminuta burguesia mercantil no período revolucionário. (Idem, pp. 15-16) Em suma, “a verdadeira burguesia, no sentido moderno do termo, encontra-se entre os construtores, comerciantes e negociantes dos quais grande parte se estabeleceu nos portos – Nantes, La Rochelle, Bordeaux e Marselha –, tirando do grande comércio marítimo uma riqueza muitas vezes considerável. Enfim, encontramos banqueiros e financistas ativos em certas praças (Lyon), mas concentrados essencialmente em Paris”. (Idem, pp. 15-16)
                 Na perspectiva ideológica, Vovelle declara que na literatura e nas estruturas sociais do Iluminismo, a burguesia se impunha percebendo a incapacidade das reformas da monarquia, que se agravava com o auxílio desta à guerra de independência dos Estados Unidos e as crises econômicas já apontadas por Hobsbawn. 
                 Durante o ano de 1789, para Vovelle ocorriam três revoluções: a constitucional (parlamentar); a urbana e municipal; e, a revolução camponesa. (Idem, pp. 20-25) Segundo o autor, “os Estados-Gerais foram abertos solenemente em 5 de maio de 1789; em menos de três meses, proclama-se Assembleia Nacional Constituinte e a vitória do povo parisiense em 14 de julho garantia o sucesso do movimento: esses três meses decisivos viram os elementos de uma situação explosiva amadurecerem até as últimas consequências. Pela primeira vez, a campanha eleitoral deu realmente ao povo francês o direito a palavra. (...)”. (Idem, p. 20) O terceiro Estado lutava nesse momento para que o voto fosse por cabeça e não por “ordem”. 
                      Discutindo o momento da Queda da Bastilha, invasão popular e destruição da prisão onde os presos eram esquecidos pela justiça, Vovelle declara que “desde o início de julho, valendo-se do contexto das assembleias eleitorais nos Estados Gerais, a burguesia parisiense estabeleceu as bases de um novo poder e o povo da capital começou a se insurgir, incendiando os postos da alfândega municipal. O recrudescimento dos tumultos no dia seguinte à demissão de Necker [ministro real reformador] levou à jornada decisiva de 14 de julho: o povo toma a Bastilha, fortaleza e prisão real, que ainda resistia. O alcance desse episódio vai muito além de um acontecimento pontual. Ele é o símbolo da arbitrariedade real e, de certo modo, do Antigo Regime que se encontra em decadência. A revolução popular parisiense avança em julho, após a condenação à morte de Berter de Sauvigny, intendente da generalité de Paris, e sobretudo início de outubro (nos dias 5 e 6), quando os parisienses, seguidos da Guarda Nacional, respondem às novas ameaças de reação, marchando sobre Versalhes para trazer de volta a família real; ‘o padeiro, a padeira e o aprendiz do padeiro’. Um programa que associa reivindicação política (controle da pessoa do rei) reivindicação econômica. A partir dessa sequência de acontecimentos, podemos julgar o elo que une a revolução parlamentar no topo, tal como ela se afirma na Assembleia Nacional, e a revolução popular nas ruas. É claro que a burguesia é mais do que reservada em relação à violência popular e às formas brutais de luta pelo pão de cada dia. Mas, entre essas duas revoluções, há mais do que coincidência fortuita: graças à intervenção popular, a revolução parlamentar pôde concretizar seus êxitos e, graças ao 14 de julho, o rei teve de ceder, readmitindo Necker no dia 16 e no dia 17, aceitando usar a roseta tricolor, símbolo dos novos tempos. Do mesmo modo, as jornadas de outubro deram um novo basta à reação planejada”. (Idem, pp. 22-23)
             As revoltas populares espalhavam-se, alcançando mais da metade do território francês, causando o “Grande Medo”. Esse grande medo, conforme Vovelle, “traduz a mobilização das massas camponesas e simbolizava sua entrada oficial na revolução. (Idem, p. 24)
            No torvelinho dos acontecimentos revolucionários do período constitucional, o rei, para Vovelle, era “pego em fogo cruzado das sugestões dos seus conselheiros (Mirabeau, La Fayette, Lameth ou Bornave, além de seus contatos familiares com os estrangeiros ou com os emigrados, que são essenciais para ele. O resultado de toda uma série de negociações realizadas em segredo é conhecido: em 20 de junho de 1791, a família real em peso abandona o palácio das Tulherias. Reconhecida no caminho, é preso e levado de volta a Paris. O anúncio da fuga causa estupor nos parisienses”(Idem, p. 31)
             Do outro lado, os revoltosos se articulam. Saint-Just, que nascia em 25 de agosto de 1767, realizava direito na Universidade de Reis, votava pela morte do rei. Era escolhido para o Comitê de Salvação Pública juntamente com Robespierre. Mas Acabou sendo guilhotinado no dia 28 de julho de 1794. Sobre a Revolução declarava:  “Houve na França, durante essa revolução, dois partidos obstinados: o povo, que querendo cumular de poder seus legisladores, gostava dos grilhões que ele próprio se impunha; o do príncipe que querendo elevar-se acima de todos, preocupava-se menos com a própria glória do que com seu destino” (SAINT-JUST, p. 13)
            Atacando a nobreza dizia que “A corte era uma nação leviana que não pensava, como se quis fazer crer, em estabelecer uma aristocracia, mas em subvencionar as despesas de seus desregramentos. A tirania existia, eles apenas abusavam dela. Apavoravam imprudentemente todo o povo, ao mesmo tempo, com deslocamentos de tropas de exército; a isso juntou-se a fome; ela era proveniente da escassez do ano da exportação de trigo. (...) A fome revoltou o povo; o desespero instalou a desordem da corte. Temia-se Paris, que a cada dia tornava-se mais facciosa com a audácia dos escritores, com a dificuldade de recursos e porque a maior parte das fortunas estava submersa na fortuna pública”. (Idem, p. 21)
            Defendendo a revolta popular proclamava que “Uma guerra ofensiva só pode ser empreendida quando o povo todo, mesmo se ele fosse tão numeroso quanto a areia, tivesse consentido individualmente; pois aqui, além da maturidade de uma semelhante empresa, a liberdade natural do homem seria violada na posse de si mesmo; ao contrário, na guerra defensiva, não é preciso nem votar nem deliberar, mas vencer; aquele que recuperasse seu baço à parte teria cometido um crime atroz, teria violado a segurança do contrato. Em um povo numeroso, é preciso renunciar à guerra ou é preciso uma metrópole tirânica como Roma e Cartago; quando Rousseau louva a liberdade de Roma, ele não se lembra mais do que o universo está acorrentado”. (Idem, p. 151)
            Explicava ainda na necessidade de igualdade, que dependia muito dos impostos; se eles forçarem o rico indolente a deixar sua mesa ociosa e correr os mares, a formar oficinas, ele perderá muito de seus modos.  A vida endurece os costumes, que só são ativos quando são frouxos. Os homens que trabalham se respeitam” (Idem) Proclamando a justiça social, notava que “A justiça será bem simples quando as leis civis, livres das sutilezas feudais, beneficiárias e habituais, não despertarem mais do que a boa fé dos homens; quando o espírito público voltado para a razão deixar os tribunais desertos”. Ou ainda defendia que “Quando todos os homens forem livres, eles serão iguais; quando eles forem iguais, serão justos. O que é honesto caminha por si mesmo”. (Idem)
            Outro personagem interessante do grupo dos revoltoso, o jacobino Robespierre (1758-1794) era em 1789 eleito pelo Terceiro Estado como deputado. Em Outubro, reunia-se na Sociedade dos Amigos da Constituição, no refeitório do convento dos jacobinos. Robespierre tornava-se o líder deste grupo. Em 17 de julho de 791, Robespierre destacava-se como o principal chefe da nova insurreição. No dia 20 de abril de 1792, Robespierre era o líder dos jacobinos contra os girondinos no poder.
           No dia 10 de agosto de do mesmo ano, com sublevação popular e instalação da Comuna de Paris, o rei era preso e as prisões ficavam cheias. Em 20 de setembro de 1792, abolição da Monarquia e Constituição da República. Disputa entre girondinos e jacobinos intensificava-se. Em 21 de janeiro de 1793, o Comitê de Salvação Pública, liderado por Robespierre assumia o governo revolucionário e instaurava a fase do Terror.
          No dia 10 de junho de 1794, fase mais intensa da Revolução, com morte de 10 mil executados. Robespierre era atacado como ditador. Em 26 de julho, ocorria a prisão de Robespierre e era sufocado o movimento de libertá-lo. Dois dias depois, Robespierre era guilhotinado juntamente com Sant-Just. Sobre o Julgamento de Luis XVI, 3 de dezembro de 1792: “Luis foi rei, e a República está fundada; a famosa questão que vos ocupa está decidida por estas simples palavras. Luis foi destronado por seus crimes; Luis denunciava o povo francês como rebelde; chamou para castiga-lo, os exércitos tiranos, seus confrades; a vitória e o povo decidiram que era ele o único rebelde; portanto, Luis não pode ser julgado; já foi julgado. Está condenado, ou a República não está absorvida. Propor o processo de Luis XVI, seja de maneira que for, é retroceder ao despotismo real e constitucional; é uma ideia contra-revolucionária; pois é colocar a própria Revolução em litígio. (...)” (ROBESPIERRE, p. 56)
A respeito da justificativa das revoltas afirmava que “os povos não julgam como as cortes judiciárias; não pronunciam sentenças; fulminaram; não condenam reis, mergulham-nos de novo no nada; e essa justiça bem vale a dos tribunais. Se é por sua salvação que os povos se armam contra seus opressores, como seriam eles obrigados a adotar um modo de puni-los que constituiria para eles um novo perigo?” (Idem, p. 58)
           Sentenciava que o rei deveria “morrer porque é preciso que a pátria viva”. (Idem, p. 65) E propunha ainda que “delibereis desde este momento sobre o destino de Luis. Quanto a sua mulher, ireis enviá-la aos tribunais, assim como todas as pessoas acusadas dos mesmos atentados. Seu filho será guardado no Templo até a paz e a liberdade pública sejam consolidadas. Quanto a ele, solicito que a Convenção o declare, desde este momento, traidor da nação francesa, criminoso para com a comunidade, solicito que lhe dê um grande exemplo ao mundo, no lugar onde morreram, em 10 de agosto [dia da prisão do rei], os generais mártires da liberdade. Solicito que esse evento memorável seja considerado por um monumento destinado a nutrir no coração dos povos o sentimento dos seus direitos e o horror dos tiranos; e na alma dos tiranos o terror salutar da justiça do povos”. (Idem, p. 65)
          Por fim, o governo revolucionário não conseguia avançar em suas propostas e, o clube dos Jacobinos é fechado, a rede das sociedades é desmantelada, os principais líderes também são despostos e próprias estruturas do governo revolucionário e o Diretório predomina juntamente com o posterior golpe de Napoleão Bonaparte em 19 de novembro de 1799. 
Bibliografia
HOBSBAWN, Eric. A Era das Revoluções (1789-1848). Rio de Janeiro: Paz e Terra, (1a ed.1977), 2003.
ROBESPIERRE, Maximilien de. Discursos e relatórios na convenção. Rio de Janeiro: Contraponto, 1999.
SAINT-JUST, Louis Antoine Leon. O Espírito da Revolução e da constituição da França (1791). São STAROBINSK, Jean. 1789: Os Emblemas da Razão. São Paulo: Cia das Letras, 1988.
VOVELLE, Michel. Revolução Francesa. São Paulo: UNESP, 2012.

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