Professora do departamento de História da Universidade da California,
Patricia Seed trata dos conflitos matrimoniais no México colonial durante os
anos de 1574 e 1821, buscando compreender as transformações das relações entre
filhos e pais, bem como os valores de amor, honra e obediência das famílias de
elite, da Igreja e da burocracia local.
Para o desenvolvimento do tema, divide a obra em três momentos. Na
primeira parte, (1574-1689) analisa a escolha matrimonial dos noivos, os quais
conseguiam definir os futuros cônjuges. As mudanças econômicas e culturais na sociedade
espanhola e mexicana levou a uma série de alterações no ambito dos noivados,
fazendo com que se fortalecesse a família patriarcal. Esses são os temas
abordados em segundo lugar (1690-1779). Por fim, com o aparecimento da lei
Pragmática de 1779, a qual se inicia a separação do Estado e da Igreja, o poder
paterno ganhava nova intensidade e os pais decidiam muito mais no casamento dos
seus descendentes.
A historiadora pesquisa nos arquivos da Cidade do México, em Madrid e em
Sevilha, as licenças matrimoniais e os processos de propostas de casamento – os
esponçais. Nos quais encontrou uma grande quantidade de conflitos pré-nupciais.
No que se refere à historiografia, Seed possui um amplo conhecimento das
obras historiográficas sobre Família.
Mas também conhece temas mais distantes a política mercantilista e os
estudos sobre Honra e Vergonha no Mediterrâneo.
A hipótese de Patricia Seed é a de que a escolha pessoal do parceiro
matrimonial no México colonial não originava de uma penetrante ideologia individualista,
mas em um cânone clássico juridico e em idéias culturais sobre a expressão de
uma vontade pessoal, como o amor, e, a importância da honra. (p.234)
Nos séculos XVI e XVII, os valores mais importantes para a sociedade
espanhola e por conseguinte a mexicana colonial era a honra, relacionada ao
amor, à vontade e à virtuosidade, sendo fundamental a castidade feminina e a
importância da palavra dada masculina. Diferentente da Inglaterra e da França,
na Espanha o amor na escolha matrimonial dos parceiros era um sentimento muito
significativo, pois representava o desejo dos nudentes de se casarem e se
procriarem segundo a legislação do Concílio de Trento (1545-1563). O sentimento
amoroso significava a manutenção dos laços conjugais e a preservação do ideal
cristão defendido pela Igreja no Novo Mundo.
Como nas Índias de Castela, o alto clero da Igreja como os arcebispos
participavam intensamente dos tribunais coloniais a serviço da coroa espanhola, esses mantinham
a ortodoxia romana que ao se refrir ao casamento defendia a honra moral em
detrimento daquela relacionada ao status e ao patrimônio. Também defendiam a
paz entre as famílias como o ideal a ser alcançado.
Dessa forma, o alto clero defendia as filhas e os filhos da autoridade
paterna e passavam a proteger a prole das famílias da elite mexicana,
defendendo assim o amor em detrimento dos interesses de manutenção ou de
ascenção econômica e social. Nessa perspectiva, os casamentos entre pessoas de
camdas sociais distintas não era totalmente interditado.
Os vizinhos, os parentes mais distantes também apoiavam o acordos
pré-nupciais dos filhos que se amavam em oposição ao desejo dos pais.
Em oposição à honra havia a vergonha - sempre pública - , a qual se
relacionava ao adultério, ao concubinato e não cumprir com a palavra dada era o
maior pecado realizado por um cristão.
A partir dos fins do Seiscentos, a sociedade metropolitana e colonial
começava a sofrer mudanças como o desenvolvimento do capitalismo mercantil e do
hommo economicus o fortalecimento da
burocracia real espanhola e o início do enfraquecimento do poder espiritual no
México colonial. A partir disso, a elite e os administradores passam a
interessar-se, não mais pela honra moral e o casamento relacionado ao amor, mas
a aquela aproximada ao status e dinheiro. Havendo, assim, dois valores de honra
que entravam sempre em conflito quando se tratava da resolução dos impasses
pré-nupciais.
A autoridade paterna passava a ser cada vez mais predominante, pois tinha
respaldo dos juízes que cuidavam dos casos de conflitos pré-nupciais. Além
disso, a importância da palavra dada masculina foi se desvalorizando com o
tempo, sendo mais relevante o ganho econômico que este daria às mulheres sem
reputação, sendo cada vez mais usual a penalidade pecuniária ao noivo que não
honrasse o seu compromisso. Também a burocracia real deixava cada vez mais que
as escolhas matrimoniais fossem de ambito “privado”.
O poder paterno crescia a partir do decreto de Carlos III, a Pragmática
de 1776, que abria a possibilidade dos pais deserdarem os descendentes.
A partir do século XVIII, o amor foi cada vez mais relacionado à lascivia
e um sentimento desvalorizado por não comportar a razão e por ter menos valor
que o capital.
Assim, as mulheres que estavam para se casar nos séculos XVI e XVII
tinham um apoio da Igreja e da comunidade, pois podiam fugir com os
pretendentes e eram resguardadas em um convento por três dias. Mas a partir do
século seguinte, a responsabilidade da preservação do status e da castidade
ficava cada vez mais a seu encargo, pois perdia o apoio dos valores culturais
da honra moral e do amor para casar-se.
Como recepção da obra, Edith
Courtier. Book review. In: The American
Historical Review, vol.95, no. 2, (Apr., 1990), p. 629, delcara a obra
de Patricia “não convinvente”, por não tratar do tema e de apenas de casos de
conflito. Também aponta que as balisas cronológicas estão imprecisas, David
Cahill. Book review. In:
Bulletin of American Research, vol. 10, 1991, pp.85-87, destaca o papel
pioneiro do trabalho de Patricia Seed, pois esta desenvolve o tema da família
por meio dos valores culturais. No entanto, salienta a necessidade de
desenvolver melhor os vários níveis de camadas sociais, pensando que o termo
“aristocracia” é demasiado simplista para o México colonial.
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